O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, maior Tribunal do país, respira muito trabalho e faz jus ao nome. Na última Semana Nacional de Execução Trabalhista, realizou 14.101 audiências, homologou 4.014 acordos e promoveu 213 leilões, arrecadando quase R$ 677 milhões no período de 15 a 19 de setembro. No ano de 2024, foram distribuídos 234 mil recursos, sendo mais de 12 mil processos para cada uma das 18 Turmas e uma média de 2.600 processos por gabinete, o que significa quase 10 processos por dia útil para cada desembargador.
Diante de números elevados, o aumento do número de desembargadores, objetivando a celeridade e eficácia na entrega da prestação jurisdicional era mais que necessário. E a Lei 15.208, de 15 de setembro de 2025, recém-publicada, possibilitou a criação de 11 cargos de desembargadores, o que, sem sombra de dúvida, contribuirá para dar vazão a números tão elevados, na nobre missão de dar a cada um o que é seu.
Hoje, o Correio da Manhã tem a honra de receber o desembargador presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, Valdir Florindo, para uma entrevista falando do hoje e do futuro da Justiça do Trabalho, que é indispensável.
CM – Presidente, recentemente, o senhor teve uma grande vitória com a publicação da Lei 15.208, de 15 de setembro de 2025, que criou 11 cargos de desembargadores. Como foi a jornada para aprovação do projeto?
Presidente Valdir Florindo – Antes de tudo, preciso dizer que a criação dos 11 cargos de desembargador se mostrou absolutamente necessária. De acordo com o relatório Justiça em Números do CNJ mais atual, o TRT da 2ª Região é o tribunal mais demandado da Justiça do Trabalho em todo o país, tanto em números absolutos quanto relativos, recebendo 43 casos novos para cada mil habitantes em sua jurisdição. Apesar desse volume, temos registrado a maior produtividade nacional, com 2.038 processos julgados por magistrado, além do mais alto índice de produtividade dos servidores. Por isso, após várias medidas da nossa gestão, o TRT da 2ª Região atingiu 100% no IPC-Jus do CNJ, índice de referência para produtividade e eficiência de todos os tribunais brasileiros. Somos o único tribunal de grande porte com esse índice nas duas instâncias, isto é, no primeiro e no segundo grau.
Esses números deixam claro que, mesmo diante da maior carga processual do Brasil, o TRT-2 entrega eficiência e qualidade. Mas também revelam um ponto crucial: para continuar cumprindo, com efetividade, a missão constitucional que a sociedade nos delega, era indispensável ampliar o número de desembargadores. A Lei nº 15.208/2025, portanto, representa a garantia de que a Justiça do Trabalho na 2ª Região seguirá respondendo com celeridade, segurança e qualidade à confiança que milhões de jurisdicionados depositam em nós todos os dias, vale destacar, sem aumento de despesas, o que reforça a eficiência da solução construída.
Sua aprovação foi resultado de um processo complexo, conduzido com absoluto respeito ao devido processo legal. O projeto nasceu no âmbito do Órgão Especial do TRT da 2ª Região e foi analisado e aprovado pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho, órgão responsável pela supervisão administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial da Justiça do Trabalho.
E, depois de obter aprovação no Órgão Especial do Tribunal Superior do Trabalho, avançou no Congresso Nacional até chegar à sanção do presidente da República. Ou seja, envolveu a participação efetiva dos Três Poderes. A jornada para aprovação do nosso projeto, portanto, envolveu magistrados, servidores, Legislativo, Executivo e a sociedade civil, todos conscientes da importância de assegurar uma prestação jurisdicional mais célere e eficiente. Tive a honra de conduzir pessoalmente essa articulação, dialogando com diferentes instâncias e construindo consensos. Foi um caminho exigente, mas trilhado com serenidade e firmeza.
CM – Presidente, quais são os reflexos imediatos na prestação jurisdicional da 2ª Região?
Presidente Valdir Florindo – Entre 2022 e 2024, tivemos um aumento de 33% na distribuição processual por desembargador. No ano passado, foram distribuídos 234 mil recursos, o que significa mais de 12 mil processos por turma e uma média de 2.600 processos por gabinete ao ano, ou seja, quase 10 processos por dia útil para cada desembargador. Em 2025, seguimos no mesmo ritmo. Esse volume demonstra a intensidade do nosso trabalho e a necessidade de ampliar a estrutura para continuar atendendo a sociedade com a qualidade que ela espera. Para enfrentar esse cenário, estruturamos diversos projetos de gestão inovadores, reconhecidos nacionalmente pela Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho.
Na segunda instância, destaco o Projeto Acervo (Plano de Auxílio Extraordinário e Emergencial para Gabinetes com Acervo Elevado de Processos), que reforça a produtividade de gabinetes sobrecarregados, e o Plano 100 , que prioriza o julgamento de processos conclusos há mais de cem dias. Já na primeira instância, implementamos o Apoio Judicial para as Unidades com Distribuição Elevada (Ajude), voltado a equilibrar a carga de trabalho nas varas. Todos esses projetos têm como objetivo a equalização da força de trabalho, proporcionando uma distribuição mais racional entre magistrados e servidores. Os resultados foram expressivos, mas a realidade mostrou que, para manter a efetividade da jurisdição em um tribunal do porte do TRT-2, seria indispensável um reforço estrutural.
Com a criação dos 11 novos cargos, passaremos de 94 para 105 desembargadores. Isso permitirá que a intensa carga de trabalho seja redistribuída de maneira mais equilibrada, conferindo ao Tribunal maior capacidade institucional de resposta. Não se trata de diminuir o esforço ou de reduzir a responsabilidade dos julgadores, pois o volume de processos permanecerá elevado, mas de assegurar as condições necessárias para que o TRT da 2ª Região continue cumprindo, com efetividade e segurança, a missão constitucional que a sociedade nos confia.
CM – Como está sendo a experiência de dirigir o maior Tribunal do país?
Presidente Valdir Florindo – Dirigir o maior Tribunal do país é uma experiência desafiadora e, ao mesmo tempo, profundamente gratificante. O TRT da 2ª Região é a maior Corte trabalhista do Brasil: reúne mais de 600 magistrados ativos, mais de 5.000 servidores, quase 1 milhão de novos casos por ano e administra um orçamento próximo de R$ 3,7 bilhões.
Esses números traduzem a dimensão da responsabilidade que assumimos, uma estrutura que, todos os dias, impacta a vida de milhões de trabalhadores e empregadores. Mas a verdadeira missão não está apenas em gerir números, está em assegurar que o Tribunal continue equilibrando dois fundamentos da nossa República: os valores sociais do trabalho e a livre iniciativa. No começo da minha trajetória profissional, no ambiente sindical, aprendi que as conquistas dos trabalhadores surgem do diálogo com os empregadores e do respeito recíproco.
Trago dessa vivência a convicção de que o diálogo e a conciliação de interesses são também os caminhos para interpretar os desafios do mundo atual. Nosso compromisso, à frente do TRT-2, é assegurar que nossos órgãos sigam aplicando a Constituição e as leis com responsabilidade, fortalecer a democracia e garantir que o respeito ao ser humano permaneça como um dos pilares do país.
Para concretizar esses valores na prática, sei que não basta apenas o trabalho interno de gestão: é essencial o diálogo interinstitucional.
CM – Uma marca dos seus discursos é a frase “A Justiça do Trabalho é indispensável”. O senhor poderia falar mais sobre isso ?
Presidente Valdir Florindo – A Justiça do Trabalho é indispensável porque representa uma das experiências institucionais mais bem-sucedidas do Brasil. Criada há mais de oitenta anos, atravessou diferentes ciclos políticos e econômicos, sempre cumprindo sua função de pacificação social.
A Constituição de 1988 reforçou esse papel ao prever expressamente a Justiça do Trabalho como ramo especializado, dotado de competência própria — posteriormente ampliada pela Emenda 45/2004, registre-se — e devidamente estruturada em todo o território nacional. É a demonstração de que o Constituinte reconheceu, com legitimidade democrática, que não há Estado de Direito sem uma instância capaz de equilibrar interesses sociais e econômicos de forma técnica, célere e eficaz.
A história também nos ensina que os extremos sempre prejudicam os cidadãos. As grandes democracias contemporâneas demonstram que o desenvolvimento social é condição para um ambiente de verdadeira e respeitosa liberdade. Não há crescimento sustentável sem justiça social, e a Justiça do Trabalho é a instituição que assegura esse equilíbrio no Brasil. Por isso reafirmo aqui: a Justiça do Trabalho é indispensável!
CM – O senhor já demonstrou ser um grande empreendedor. Quais as perspectivas para o futuro?
Presidente Valdir Florindo – As perspectivas para o futuro da Justiça do Trabalho passam por consolidar dois instrumentos que considero decisivos: a tecnologia e o sistema de precedentes. A tecnologia, aqui, não é apenas um recurso de automação ou de aceleração processual. Ela deve ser compreendida como um meio de ampliar a transparência, oferecer maior previsibilidade às decisões e aproximar a Justiça do cidadão.
Inteligência artificial, gestão de dados e soluções digitais são ferramentas que, utilizadas com responsabilidade, reforçam a legitimidade institucional e garantem eficiência sem comprometer a segurança jurídica. Ao lado disso, a formação de precedentes qualificados representa um passo fundamental para conferir integridade à jurisprudência e transmitir confiança aos jurisdicionados. A criação, em nossa gestão, da Seção de Uniformização da Jurisprudência Regional no TRT-2 é exemplo concreto dessa preocupação. Ela permite que nosso Tribunal contribua de maneira estruturada para a construção de entendimentos estáveis, coerentes e alinhados com a missão da Justiça do Trabalho.
Ainda temos um ano de gestão pela frente, e até o último dia trabalharemos com firmeza para consolidar os projetos desenvolvidos e continuar implementando novas iniciativas. Depois disso, seguirei à disposição do nosso país. Tenho acompanhado os grandes dilemas nacionais e estou experienciado para contribuir em outras frentes, sempre com o mesmo espírito de responsabilidade e compromisso com a democracia. Como escreveu o poeta espanhol Antonio Machado, “Caminante, no hay camino, se hace camino al andar”. O caminho se faz ao caminhar — e eu seguirei cumprindo o meu caminho, pronto para servir onde for necessário.